A ver os astros
Juntámo-nos a ver o astros, a olhar para a noite. Não éramos muitos mas pelo menos todos interessados. A poluição luminosa, o reflexo das luzes das povoações em volta, complicaram um pouco a observação. Parece que já não são muitos os locais da Europa onde se pode observar o céu na mais completa escuridão. Um céu pristino! Se olharmos para uma fotografia aérea da noite apercebemo-nos que praticamente toda Europa está iluminada sendo o continente mais iluminado, contrastando fortemente com África. Esta é também uma forma de esbanjar dinheiro porque não iluminamos o que interessa e a luz perde-se para o céu.
É certo que a noite sempre nos estimulou a imaginação e as estrelas ou o firmamento, mais ainda. Penso que é fascinante pensar que, numa altura e que ainda o observavam apenas com os olhos, sem outros artifícios, tenha sido possível estabelecer o calendário que ainda hoje utilizamos com base nos diversos ciclos da lua, estabelecendo o número dos dias do ano, os meses as semanas e até as horas.
Vemos também a estrela Polar que, por estar exatamente acima do Pólo Norte, onde passa o eixo de rotação da terra, parece estar imóvel enquanto a terra ou a abóbada giram à sua volta. Esta estrela já nos permitiu conhecer o mundo e navegar para além do desconhecido quando contávamos apenas com as bússolas e os astrolábios, muito antes de colocarmos em órbita satélites em rotação que nos dão o nosso local exato com erros de poucos metros.
Com os programas de computador, aplicados até ao telemóvel, conseguimos identificar as diversas constelações, já que os planetas nesta época do ano descem cedo abaixo do horizonte e têm assim um tempo muito curto de observação. Vemos a Ursa Maior, a Ursa Menor, a Águia, o Dragão, as estrelas mais brilhantes, creio que Arcturus, algumas das constelações do zodíaco…
Um comboio silva na noite escura deixando um rasto de luz… Continuamos a decifrar o céu e vemos a agora a Via Láctea, a galáxia onde se insere o nosso sistema solar. Ao longe brilham incontáveis estrelas. E pensar que estão tão distantes que o brilho, que agora vemos e que chegou até nós à estonteamento velocidade da luz, pode ser apenas um clarão duma estrela que entretanto já morreu. Olhamos as estrelas e temos assim um vislumbre do passado, pensamos na Humanidade que cresceu a olhar o céu e que hoje envia máquinas, cada vez mais sofisticadas e nos devolvem imagens de planetas distantes onde aterraram….
Formulamos desejos secretos quando passa um estrela cadente… Há até quem diga ser possível prever o futuro pelas estrelas… Mas, nos dias de hoje, em que a realidade ultrapassa sempre a ficção, não me acredito nessas premonições… E no entanto, ao olhar o céu, tenho uma estranha tranquilidade e acredito que seremos capazes de ultrapassar todas as adversidades, como se os nossos antepassados nos quisessem transmitir um mensagem de esperança.
Fernando Faria Pereira
Supervisor da Reserva Natural do Paul do Boquilobo
Texto publicado no jornal “O Almonda“